14.3.08

Obama e as idéias

Barack Hussein Obama "é o cara" da atual campanha presidencial dos EUA. Negro, nascido no Hawai, filho de um keniano, passou parte da infância na Indonésia, atuou em movimentos sociais na periferia de Chicago, para onde voltou - após estudar direito em Harward - para se tornar professor de direito constitucional. Em suma, o sujeito tem uma biografia pra lá de incomum, seja porque se trata de um caso excepcional de self-made-man (que tanto agrada ao imaginário yankee), seja porque foge ao figurino clássico do líder político norte-americano.
Até janeiro passado, era apenas um dos seis pré-candidatos do Partido Democrata e era lembrado apenas pelo seu estilo fora-de-esquadro. Mas, ao saltar em 30 dias para o primeiro lugar na corrida democrata, ultrapassando a super-star Hillary Clinton, ganhou as manchete no mundo todo e, claro, virou alvo dos concorrentes. Surpreendentemente, da campanha de Hillary veio a acusação de ser apenas um bom orador, vazio de projetos e de idéias. A pecha colou, e pelos quatro cantos passou-se a cobrar de Obama que explicitasse seu plano de governo, que dissesse como resolveria uma crise internacional quando às 3hs da madrugada seu telefone tocasse e não houvesse ninguém para orientá-lo, enfim, que explicasse melhor como pretende dar concretude ao seu slogan: "Change! Yes we can".
Ora, ora. Até aqui, neste rincão de mundo, pipocaram artigos e críticas à suposta escassez de idéias da campanha de Obama. Gente séria e bem pensante, como o jornalista José Arbex e o economista e ilustre palmeirense Luiz G. Belluzzo, lamentaram a falta de ousadia de suas propostas e a ausência de temas, se não revolucionários, ao menos reformistas. Será?
Será que Obama teria saído da lanterninha se viesse ao público conservador dos EUA propor o financiamento estatal da saúde? Será que poderia dizer que vai regularizar a vida dos milhões de imigrantes ilegais que ralam nas terras de Tio Sam? Evidentemente que não. Com a sua incomum trajetória de vida, sua relativa independência da máquina partidária, Obama não pode se dar ao luxo de cometer arroubos esquerdistas, nem ousar avançar o sinal do cismado eleitor norte-americano.
Há ainda uma estrada longa a percorrer até a eleição de novembro, e parece óbvio que quanto menos explicito puder ser o discurso de Obama, melhor. Como no caso de Lula, a eleição de Obama é trasformadora por si, como marco histórico de profundo simbolismo. É claro que não poderá virar o país do avesso, resgatar toda a desigualdade social que se acumula na sociedade americana, mas como Lula, sua vitória autoriza a sociedade a imaginar novos paradigmas, a experimentar novas práticas. E estas mudanças, por seu caráter simbólico e seus efeitos de "empoderamento" (palavra horrivel que herdamos dos gringos) sobre cada um dos Obama ou dos Lula que não viraram presidente, mas que estão na vida e na luta, são sem dúvida potencialmente mais transformadoras do que as bravatas e os bordões de qualquer campanha. A esse respeito, vale a pena conferir o artigo um modo radical de apoiar Barack Obama, publicado no Le Monde Diplomatique.

Um comentário:

  1. Marcelo, grácias pelo link para o Diplô Brasil. Além disso, acho que nós e teu blog pensamos parecido em muitas coisas. Gostei muito de ler, vou botar nos favoritos e no RSS


    Abração
    Antonio Martins, editor
    antonio@diplo.org.br

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