29.5.11

jovem pra quê?



Na última sexta, estive no Fórum Social do ABCD, participando de um debate sobre o tema "Juventude e Trabalho". Tema difícil, afinal, mesmo nas nações ditas desenvolvidas, o desemprego juvenil é extremamente elevado e a falta de perspectiva para os jovens tem provocado movimentos de contestação bastante virulentos que se espraiam pela Europa (como o grupo denominado "jovens sem futuro" que, surgido na França, inspirou o movimento M15 que toma conta das praças da Espanha).

O que dizer aos jovens? Que mundo temos a oferecer àqueles que chegam cheios de vontade e energia à vida adulta?

Em tese, seria desejável que conseguíssemos postergar a entrada dos jovens no mercado de trabalho. Primeiro, porque não há razão para lançar um indivíduo em sua plenitude vital e criativa às linhas de montagem, às aborrecidas tarefas de escritórios ou mesmo às responsabilidades e preocupações da vida profissional. Segundo, porque no capitalismo, para bem ou para mal, há inexorável redução da necessidade de trabalho vivo e, consequentemente, eliminação de empregos. Se assim é, parece razoável que os cada vez mais escassos postos de trabalho sejam ocupados por trabalhadores maduros, mais necessitados, com maiores obrigações financeiras, etc.

Porém, pergunte aos jovens se gostam da idéia. Tirante um ou outro mais cuca fresca, os jovens em geral são ávidos para reduzir sua dependência em relação à família e, mais do que isto, muitos vivem contando os dias para terminar a intragável escola e cair na vida. E o trabalho, um emprego qualquer que seja, de entregador de pizza ou de atendente de telemarketing, é o caminho mais curto a ser seguido.

O que fazer? Como resolver esse dilema tão característico de nosso tempo?

Claro que não tenho resposta a esse assunto e desconfio que a sociedade contemporânea levará ainda um tanto de tempo lidando com o problema. Contudo, uma coisa me parece imprescindível. Não será possível manter a juventude fora do mundo do trabalho sem que se ofereça uma alternativa concreta para a qual possa canalizar o impulso fáustico (vontade de potência e sede de sentido) que, com maior ou menor intensidade, habita o espírito de quem acaba de virar gente. É preciso, portanto, reinventar o mundo do não-trabalho ou do pré-trabalho. O modelo de escola que aí está já há muito que não serve, mas apesar de muito se falar a respeito, pouco - ou quase nada - se tem conseguido mudar. Cada vez mais as escolas se configuram como um fardo e repaginar a velha e tradicional escola só faz aumentar a distância para alguma solução.

Enfim, tal como concluí minha participação no Fórum, acho que a temática "Trabalho e Juventude" talvez seja prematura. Deve ser precedida de outra reflexão: quem são os jovens de hoje? Para depois se avançar sobre qual a educação que cabe a essa juventude. Só então fará sentido falar em "postergação" do mundo do trabalho.

PS: E sobre a reinvenção da escola, tema que conheço pouco, tenho apenas um palpite a dar. Creio que é preciso trilhar o caminho da educação com sentido. A essa geração plasmada na velocidade, na busca rápida pelo satisfação, na relação utilitária com o mundo, é urgente tornar a educação um fim em si mesma, algo que tenha sentido per se, e que, portanto, não se configure apenas como um meio para conquistas futuras - como passar no vestibular ou se preparar para uma profissão promissora.
E, nesse sentido, por estranho que possa parecer à primeira vista, creio que são as escolas técnicas que mais se aproximam dessa proposta. Como são obrigadas a focar o ensino em alguma especialização do mundo do trabalho, permanecem mais coladas a aspectos concretos do aprendizado, resultando numa experiência mais carregada de sentido e que, por isso, permite um avanço maior inclusive nas disciplinas mais etéreas.

24.5.11

um debate oportuno

Nada como um catedrático, autor de gramáticas, fundador do Museu da Língua Portuguesa e, portanto, autoridade inquestionável sobre o assunto, para deixar claro os aspectos desconsiderados pelos doutos que, ignorantes e banhados em naftalina, saem por aí clamando pela "norma culta", como se a questão se resumisse a um debate jacobino.

É sintomático que uma polêmica como essa tenha surgido alguns dias após o episódio da "gente diferenciada". Plasmam-se no mesmo caldo de cultura, de uma classe dominante que vira e mexe se espanta com os novos bárbaros que emergem dos buracos de metrô, que consomem de maneira frenética ou que "assassinam" a 'norma culta' a três por quatro.

Para surpresa dessa gente reacionária, do jeito que a coisa vai, acabaremos falando como os franceses, que, como ensina o Prof. Ataliba, não pronunciam o "s" há séculos e que, a despeito do desvio, continuam encantando a trupe dos iguais.

10.5.11

éh...., me passou


É bastante conhecida a expressão de Sergio Buarque de Holanda que, no livro "Visões do Paraíso", chamou de "procissão de milagres" a ocorrência de sucessivos ciclos econômicos que marcaram a história de nosso país.

Recentemente, tratei desse tema em sala de aula.

Dias depois, ao aplicar uma prova e questionar os alunos sobre os determinantes de nossa industrialização, um inspirado aluno se sai com uma tirada inusitada, nem de todo equivocada:

a causa da industrialização? "o vácuo de milagres"

2.5.11

identidades sociais e ressentimento psicológico

Nesta palestra de Maria Rita Kehl (copiada em 4 videos no youtube - clique abaixo) uma interessante perspectiva do significado do "ressentimento" na psique da sociedade contemporânea. Mais interessante ainda, porque a conhecida psicanalista e professora da PUC-SP parte da interpretação do indivíduo - portanto, uma abordagem clínica - para chegar a uma interpretação das "identidades sociais" em nossa época, e, mais do que isso, de alguns traços constitutivos da sociedade brasileira.

A palestra, que fez parte do programa Café Filosófico (CPFL/Cultura), resulta de um livro escrito pela psicanalista, denominado simplesmente "Ressentimento" (Editora Casa do Psicólogo, 2004), onde ela avança com muita originalidade sobre o significado de certas máculas em nossa memória social (como a escravidão e a ditadura militar) como constitutivas do imaginário da política brasileira. Infelizmente, o livro está esgotado, mas o vídeo da palestra serve bem para apresentar os argumento fundamentais da autora.