24.1.11

dos pensamentos solúveis em água

Na Austrália o sertão é chamado 'Outback'.
No Brasil a Mata Atlântica cobre uma grande serra que se estende pelo litoral do sudeste.

O outback se assemelha a um gigantesto tabuleiro.
A Mata Atlântica tem um relevo acidentado, cheio de picos e grotas.

No outback existem cangurus.
Na Mata Atlântica há micos. Micos de vários tipos: preto, dourado, estrela, de cara-preta.

Pontuam o outback cidades que se formaram com gente vinda da Inglaterra.
Pipocam na Mata-Atlântica cidades que evoluíram de povoados surgidos com o avanço da colonização portuguesa.

No verão, grandes tempestades caem por lá e por cá.

Só que lá, a poça cresce pro lado, enquanto aqui, o poço cresce pro alto.

Canguru, bicho precavido, salta de banda, à medida em que as águas, morosas, vão se alargando.
Mico, bicho esperto, salta para os galhos altos, mas morre na lama quando a árvore desce o morro com as águas nervosas. Preto, dourado ou estrela, terminam afogados numa maçaroca que tudo junta, de cotia a Ecosport.

Lá, esperam o rio, vagaroso, estreitar;
Aqui, do poleiro, a trupe anda dizendo que tudo seria diferente se os micos pensassem como cangurus ingleses.

Êita trupe!

21.1.11

os novos crentes e suas máquinas amestradas

Tenho um tanto de amigos e de colegas que, por vício de formação ou viés de alma, são entusiastas desta Era dos Algoritmos: estão certos de que estamos na soleira do dia em que os programas de computadores serão capazes de  equacionar os principais entraves da vida humana na terra. Os cada vez mais poderosos algoritmos construídos por matemáticos obcecados deverão nos disponibilizar crescente capacidade de processamento de informações complexas e, consequentemente, de previsibilidade do futuro. Os exemplos, dizem, já estão à solta: diga ao algoritmo com que gastas seu dinheiro que ele lhe confidenciará quanto tempo deverá durar o seu casamento; conte-lhe os detalhes de um roteiro de filme (ainda no papel!) que ele lhe dará a bilheteria; delegue seus tostões à sua administração, pois terás maximizado de forma sobrehumana os teus rendimentos.

Midas, perto dessas maravilhas, é pinto.

E, convenhamos, de fato os produtos desses "pensamentos maquinados" já nos ajudam em tantas esferas da vida que devíamos talvez aceitar resignados os presságios de um mundo completamente equacionado, livre de riscos e contratempos. Restaría-nos, talvez, surfar hedonisticamente sobre as suas delícias. Gozo do primeiro ao último minuto.

Porém, problemas filosóficos à parte - ex: como apreciar o bom, sem conhecer o ruim? - não tenho como compartilhas do entusiasmo dos amigos crentes quando o assunto é a economia.

Em primeiro lugar, porque, no limite, economia é tão somente 'política', isto é, seu objeto é o mundo que desejamos. Portanto, não se trata de equacionar problemas complexos entre a oferta e a demanda do presente, mas sim de eleger estratégias de desenvolvimento cujos resultados afetam heterogeneamente os distintos grupos sociais no futuro. Justificar porque uns se sairão melhor do que outros é questão de arte política, de convencimento ideológico, e não vejo algoritmo capaz de harmonizar as diferentes visões de mundo que habitam as mentes de uns e de outros. Mas, sei que muitos - principalmente no time dos crédulos - não se sensibilizam com a órbita da política. Imaginam que poderá ser pacificada, assim que os obstáculos da vida prática forem vencidos pelo poder das TI's.

Passemos então a um segundo argumento. Vamos baixar a bola e aceitar a economia como um simples jogo entre ofertantes e demandantes. Vamos também dar de barato que, não fossem as interferências exôgenas - políticas - e as imperfeições decorrentes de falhas informacionais, seria possível imaginar um super algoritmo capaz de indicar o nível ótimo de produção a preços ótimos  e que, portanto, deveria satisfazer ao conjunto dos viventes (pobre Midas!). Estaria vencido o problema econômico?

Suspeito que não. Chegaríamos a um velho paradoxo, que aos pensadores econômicos mais atentos  - lembro-me por exemplo de Schumpeter - já incomodava muito antes do desenvolvimento das maquinetas. A questão é que, se o tal super algoritmo for capaz de incorporar todas as variáveis que afetam os mercados e indicar, em tempo real, volumes e preços ótimos, estaria extinto o lucro (chamado de extraordinário) e não haveria mais motivação para o investimento capitalista. Nesse delirante mundo automatizado, qualquer mudança de parâmetro ou qualquer inovação tecnológica seria imediatamente incorporada ao algoritmo, dissipando seu potencial gerador de lucro e distribuindo  seus benefícios de forma homogênea e instantâneaao conjunto do mercado.

Um modo mais prático de pensar no problema é imaginar que o google desenvolva um aplicativo que permita processar a totalidade das variáveis que afetam a valorização das ações na Bolsa de NY. Ao disponibilizar seus resultados à internet, produziria uma paralisia geral dos negócios, visto que todos os agentes econômicos se posicionariam do mesmo lado do mercado (comprador ou vendedor).

Curioso, né não? Em nome dos mercados e da suas supostas impessoalidade e isonomia, descobriríamos que as leis de mercado só podem funcionar quando a diferença e as condições desiguais permitam vislumbrar vantagens exclusivas e, portanto, induzam à incessante troca de posições.

Outra possibilidade seria descobrirem que o tal algoritmo também responde pelo nome de 'socialismo'.

4.1.11

dilma larga com boa vantagem

Tentando moderar o otimismo, elaborei um quadro comparando os times que começaram jogando nos governos de Lula (em 2003) e de Dilma (2011).

A cada nome, dei nota de 1 a 5, de acordo com os seguintes critérios:

1 = péssimo, lamentável;
2 = fraco, ruinzinho;
3 = não ajuda, nem atrapalha.
4 = bom nome, mas tinha gente melhor.
5 = ótimo, melhor impossível.

Como poderão notar, quando atribuí as notas não considerei apenas o nome ou a biografia de cada um, mas, a sua adequação ao cargo. Muitos, inclusive, começaram numa posição, foram remanejados no governo Dilma e tiveram suas notas alteradas. Além disso, considerei também o peso político dos sujeitos, de tal maneira que um cara bom, mas sem força, pode valer menos que um ruinzinho com cacife. Somei todos e comparei os totais: o time de Lula (2003) alcançou 95 pontos enquanto o de Dilma chegou a 124.

Ou seja, segundo a agência My Buttons & Buttons, o time inicial de Dilma é 31% superior ao que começou jogando com Lula.

Claro que esse diferencial era mais do que esperado. Trata-se de um governo de continuidade - bidestilado - e que, portanto, herda de Lula os quadros de melhor desempenho, mais maduros e experimentados. Também conta a favor de Dilma o crescimento dos partidos de centro esquerda no congresso e a aliança política com o PMDB, fatores que, somados, reduziram a dependência das siglas nanicas e os riscos de chantagens da oposição.

Considerando que se deve acrescentar a esse salto qualitativo da equipe um cenário econômico e social muito mais favorável que aquele encontrado por Lula em 2003, dá pra dizer que Dilma tem tudo para fazer um excelente governo. Suspeito até que, pelo seu perfil e suas características pessoais - aparentemente ela é do tipo que cresce quando provocada - o cargo lhe fará crescer a aura de estadista.

Há, portanto, razões "objetivas" para o otimismo. Vejam o quadro abaixo e façam suas apostas.