20.10.08
hora de sair do muro
Paul Krugmann, o mais recente vencedor do nobel de economia, publicou artigo na data de ontem (veja cópia abaixo) chamando atenção para a tarefa crucial - e herética - a ser desempenhada pelo setor público (dos EUA) no processo de recuperação econômica pós-crise.
Pois o mesmo alerta valerá para o Brasil. Nos últimos dias, não foram poucos os economistas e palpiteiros market-friendly que flertaram com a tese de que ante a necessária frouxidão monetária do BC (que encharcou nossos bancos de dinheiro para estimular o crédito), caberá ao governo a tarefa de desaquecer a demanda por meio de corte de gastos (aumento do superávit fiscal). Seria um erro grotesco, pois, sem o fôlego da demanda externa, será preciso usar de todos os expedientes à mão do governo para estimular a demanda interna e garantir o crescimento do PIB.
É hora de sabermos se Lula é de fato um estadista ou apenas um hábil presidente que até aqui contou com a sorte. Se der trela aos alertas mochos dos autistas do BC, internalizará a crise e terminará seu governo de forma mediocre.
Desta escolha resultará nosso futuro. Em poucas semanas saberemos.
Segue o artigo do Krugmann, publicado dia 18/10 no NYT e traduzido pelo UOL.
hora de gastar o dinheiro público
Paul Krugman
Colunista do The New York Times
O Dow está subindo! Não, está caindo! Não, está subindo! Não, está...
Deixe para lá. Enquanto o mercado de ações maníaco-depressivo domina as manchetes, a história mais importante é a grave notícia sobre a economia real. Agora está claro que o resgate aos bancos é apenas o começo: a economia não financeira também está precisando desesperadamente de ajuda.
E para fornecer essa ajuda, nós teremos que colocar alguns preconceitos de lado. Está politicamente na moda se queixar contra os gastos do governo e exigir responsabilidade fiscal. Mas no momento, maiores gastos do governo é exatamente o que o médico recomenda, e as preocupações com o déficit orçamentário devem esperar.
Antes que eu possa falar disso, vamos falar sobre a situação econômica.
Apenas nesta semana, nós soubemos que as vendas no varejo despencaram de um penhasco, assim como a produção industrial. O desemprego está em níveis elevados de recessão, e o índice manufatureiro do Fed da Filadélfia está caindo no ritmo mais rápido em quase 20 anos. Todos os sinais apontam para uma recessão que será feia, brutal - e longa.
Quão feia? A taxa de desemprego já está acima de 6% (e medições mais amplas de subdesemprego estão em dois dígitos). Agora é virtualmente certo que a taxa de desemprego ultrapassará 7%, e possivelmente 8%, tornando esta a pior recessão em um quarto de século.
E quão longa? Poderá ser muito longa.
Pense no que aconteceu na última recessão, que se seguiu ao estouro da bolha de tecnologia do final dos anos 90. Na superfície, a resposta política para aquela recessão parece uma história de sucesso. Apesar dos amplos temores de que os Estados Unidos experimentariam uma "década perdida" ao estilo japonês, isso não aconteceu: o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) conseguiu promover uma recuperação daquela recessão ao reduzir as taxas de juros.
Mas a verdade é que estamos parecendo japoneses há algum tempo: o Fed teve dificuldade para conseguir tração. Apesar das repetidas reduções dos juros, que no final levaram a uma taxa dos fundos federais de apenas 1%, a taxa de desemprego continuou subindo; foram necessários mais de dois anos para que o quadro do emprego começasse a melhorar. E quando uma recuperação convincente finalmente chegou, foi apenas porque Alan Greenspan conseguiu substituir a bolha de tecnologia pela bolha imobiliária.
Agora a bolha imobiliária estourou, deixando uma paisagem financeira repleta de escombros. Mesmo se os esforços em andamento para resgatar o sistema bancário e descongelar o mercado de crédito funcionarem -e apesar de ainda ser cedo, os resultados iniciais são decepcionantes- é difícil ver o setor imobiliário se recuperando tão cedo. E se há outra bolha a caminho, ela não é óbvia. De forma que o Fed terá ainda mais dificuldade para conseguir tração desta vez.
Em outras palavras, não há muito o que Ben Bernanke possa fazer pela economia. Ele pode e deverá reduzir ainda mais as taxas de juros - mas ninguém espera que isso faça mais do que fornecer um leve estímulo econômico.
Por outro lado, há muito o que o governo federal pode fazer pela economia. Ele pode ampliar os benefícios aos desempregados, o que ajudaria tanto as famílias em dificuldades a sobreviverem e colocaria dinheiro nas mãos de pessoas que provavelmente o gastarão. Pode fornecer ajuda de emergência aos governos estaduais e locais, para que não sejam forçados a cortar ainda mais seus gastos, o que degrada os serviços públicos e destrói empregos. Ele pode comprar hipotecas (mas não pelo valor nominal, como propôs John McCain) e reestruturar os termos para ajudar as famílias a permanecerem nos seus lares.
E este é um bom momento para promover sérios gastos em infra-estrutura, algo que de toda forma o país seriamente necessita. O argumento habitual contra obras públicas como estímulo econômico é que demoram muito: quando se chega de fato a reparar aquela ponte e a atualizar aquela linha ferroviária, a recessão já passou e o estímulo não é mais necessário. Bem, esse argumento não tem força agora, já que as chances de que esta recessão acabe tão cedo são virtualmente nulas. Então vamos botar esses projetos em andamento.
Será que o próximo governo fará o que é necessário para lidar com a recessão? Não se McCain conseguir uma virada. O que precisamos agora é de mais gastos do governo - mas quando McCain foi perguntado em um dos debates sobre como lidaria com uma crise econômica, ele respondeu: "Bem, a primeira coisa que temos que fazer é colocar os gastos sob controle".
Se Barack Obama se tornar presidente, ele não terá a mesma oposição automática a gastar. Mas ele enfrentará um coro de tipos lhe dizendo que precisa ser responsável, que os grandes déficits que o governo administrará no próximo ano se fizer a coisa certa são inaceitáveis.
Ele deve ignorar o coro. A coisa responsável, no momento, é dar à economia a ajuda que necessita. Agora não é hora de se preocupar com déficit.
Tradução: George El Khouri Andolfato
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