10.6.10

tabu como herança

Se é verdade que Lula herdou de FHC uma economia em situação de enorme fragilidade - déficit de U$ 7,6 bi em conta corrente; saída liquida de U$ 4,7 bilhões de capitais de curto prazo; apenas U$ 37 bilhões de reservas cambiais; R$ 881 bilhões de dívida pública; inflação anual de 12,53%; Selic a 21,9% e PIB crescendo apenas a 2,7% - é também verdadeiro que Lula, embora tenha dado conta de reverter a maior parte dos problemas que lhe foram entregues, foi o responsável por alimentar o mito da autonomia operacional do Banco Central. No coração da banca financeira e na boca-rota dos mídia-ligeira, foi no BC que se erigiu o virtuosismo da era Lula; o resto, dizem, foi populismo.

Ora pois! Da herança maldita, temos agora a armadilha ideológica da autonomia do Banco Central. Um mito, que como aqueles nas histórias dos irmãos Grimm, recomenda severamente que não se abra a tal porta do corredor do castelo.

Sem votos para influir na equação política do país, é assim que os poucos e graúdos rentistas garantem mais uns dias de maná.

Como escapar dessa maldição?

Ora, se não há quem se comprometa claramente com o fim da autonomia do BC, que se faça ao menos uma mudança por dentro, reformando as regras do sistema de metas . Há espaço para tanto e diversos exemplos no resto do mundo nos servem de exemplo.

Primeiro, é perfeitamente possível, copiar o FED dos EUA e redefinir o método de cálculo da inflação, expurgando itens que sofrem oscilações muito frequentes ou efeitos produzidas por choques exôgenos. Trata-se, como dizem, de mirar no "core" da inflação. Além disso, é  mais do que necessário retirar também do cálculo os efeitos dos preços administrados que, obviamente, não tem absolutamente nada a ver com oscilações da renda e, portanto, não devem ser levados em conta. Outro aspecto que poderia ser alterado é o ponto no tempo que serve de baliza  para a definição da meta de inflação. Enquanto aqui se trabalha com o horizonte dos próximos 12 meses, em outros países a baliza é colocada mais à frente, permitindo que o BC tenha mais tempo para manejar a política monetária, evitando que sua ansiedade em acertar no curto prazo resulte em oscilações desnecessárias ou overshootings. Alguém um pouco mais determinado poderia até propor um sistema com duas metas: uma de preços e outra de emprego. Vários países trabalham com esse sistema, sem que isso signifique o fim da estabilidade. Por fim, assim como faz o Banco da Inglaterra, talvez fosse o caso de reservar um assento no CMN ou mesmo no Copom para um conselheiro externo, de fora do clube dos rentiers.

Se a autonomia virou tabu, que o BC permaneça com os seus graus de liberdade, que preserve as equações e a torre de marfim, mas que esteja apto a fazer aquilo que a sociedade, através de seus representantes políticos, defina como desejável em termos de nível de emprego, de preços e taxas de crescimento da renda. O que é intolerável é continuar assistindo aos sacrifícios e recorrentes abortos de nosso crescimento justificados pelo ábaco enferrujado do BC, sempre a recomendar os maiores juros do mundo.

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