24.6.11

mas que falta alguma coisa, falta

O historiador István Jancsó deixou um belo depoimento biográfico que foi publicado por seus alunos um mês após sua morte, em março de 2010 (Um historiador do Brasil: István Jancsó. MOREL, M. et alli. São paulo: Ed Hucitec, 2010).

Lá, quando falava da "nação como projeto", apontava para uma lacuna de nossa historiografia que me parece das mais relevantes. Segundo o Prof. István, quando se trata de pensar os fundamentos da nação brasileira, "as pessoas gostam de iluminar terrenos já iluminados". Nos acomodamos às análises dos chamados "intérpretes do Brasil" (Caio Prado, Sergio Buarque e Gilberto Freyre) ou nos apoiamos na vigorosa e influente tese de Fernando Novais - que trata da crise do sistema colonial - mas pouco avançamos na reflexão sobre processos históricos mais recentes e suas relações com o Brasil contemporâneo. No esforço de construir uma genealogia da identidade nacional, dar-se-ia excessivo peso a nosso passado colonial e muito pouca relevância à dinâmica histórica de nosso período republicano.

De fato, embora eu não seja um estudioso do assunto, me arrisco a dizer que a complexidade social brasileira, em suas várias dimensões (cultural, política, econômica), não parece caber apenas em nossa matriz colonial.

Não há como discordar que nosso sentido de nação é fraco, quase uma abstração, e que está em nossa herança colonial muitas das razões desse nosso traço. Mas, por exemplo, o quanto disso não foi amplificado por um mar de imigrantes - que se tornaram gente após a urbanização - e que guardam muito pouco sentido de nacionalidade? Costumo perguntar a meus alunos - do interior de São Paulo - quantos tem sobrenomes estrangeiros. Invariavelmente, mais de 95% tem lá o seu avô italiano, japonês ou espanhol. E qual a relação dessa gente com o Brasil colônia? Em que medida são brasileiros? Ou, por outro lado, quais os nexos entre suas experiências e expectativas de vida e os rumos da "nação brasileira"?

Não conheço em profundidade a bibliografia a respeito. Talvez exista gente nova produzindo estudos que avancem nesse esforço de interpretação do Brasil contemporâneo. Mas, creio que o Prof. István tocou em um problema real e grave de nossa historiografia. Seria muito bom que novos intérpretes viessem a tona (se é que isso ainda é possível) e pudéssemos transitar por outras narrativas, que não aquelas produzidas em um país predominantemente agrário e que resultava da visão de mundo de gente oriunda da classe dominante.

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