31.3.11

'carne de vaca', uma expressão anacrônica

Segundo os entendidos, a dita carne de vaca - tão abundante em nossas paragens que virou expressão a indicar algo rotineiro e sem qualidades especiais - deve se tornar uma iguaria, coisa como caviar ou escargot. O despertar dos orientais para o mundo do consumo, dizem, tornará o bife cada vez mais caro e raro; o jeito será revisitar as partes menos nobres do gado, que vínhamos esnobando nas últimas décadas.


Nessa toada, por exemplo, ressuscitei recentemente, com grande sucesso aqui em casa, a saudosa brachola - aquele bife enrolado e cozido no molho de tomate - que faz a alegria de qualquer espaguete, ou mesmo de um desenganado arrozinho. Na mesma linha, outro prato candidato à emergência é o Ossobuco. Saboroso, saudável e barato, têm a vantagem de também distrair a clientela. 


Pois, aproveito a boa hora para compartilhar uma receita de Ossobuco que me chegou clandestina. Antes, porém, um aviso: assim que o Camboja completar a sua industrialização, repasso a receita de sopa de pedras (he, he, he.....)




Ossobuco braseado
Por Licínia de Campos 
Nutricionista, integrante do comitê técnico do Serviço de Informação da Carne (www.sic.org.br)


Ossobuco em italiano significa osso com um furo, uma referência ao orifício preenchido de tutano localizado no centro da peça, retirada do corte transversal da perna traseira do bovino. É um corte que contempla músculo, osso e tutano e confere ao prato alto nível de valor nutricional e cálcio. É uma especialidade milanesa, braseada com hortaliças, vinho branco e caldo. Quase sempre leva como guarnição a gremolata, que é um tempero à base de salsinha, dente de alho picado bem miúdo e uma colher de chá de casca de limão siciliano ralada, que deve ser salpicado por cima da carne. 
Há dois tipos de ossobuco: na versão mais antiga, o ossobuco in bianco é aromatizado com canela, folha de louro e gremolata; já na versão moderna, e mais popular, inclui tomates, cenouras, salsão e cebola, c om a gremolata opcional.
O ingrediente básico desse prato é relativamente barato e muito saboroso. Como o processamento é feito por braseamento, o corte rijo se torna macio. O que significa brasear? Do termo francês braiser, é uma combinação de métodos de cocção, que utiliza calor seco e úmido. Normalmente, o alimento é refogado em alta temperatura e depois finalizado em uma panela com tampa (ou pressão) com quantidade variável de líquidos. O brasear se baseia em calor, tempo e umidade para quebrar o rijo tecido conectivo, o colágeno da carne, revelando-se um método ideal para cozimento de cortes rijos. O cozimento lento ou em panela de pressão são expressões do brasear, como por exemplo, o lagarto assado de panela. 
A maioria dos braseados segue os mesmos passos básicos. O alimento a ser braseado é primeiramente selado, até ter sua superfície dourada e seu sabor incrementado. Se o alimento não liberar seus próprios sucos, acrescenta-se então uma pequena quantidade de líquido, que inclui quase sempre um elemento ácido, como tomates, cerveja ou vinho, adicionado à panela, e complementado com caldo. A panela é então tampada e o alimento cozido em fervura bem lenta, até a carne ficar tenra. O líquido resultante do cozimento é finalizado para criar um molho. 
Um braseado de sucesso deve intermediar os sabores dos alimentos cozidos com o líquido do cozimento. Esse método de cocção dissolve o colágeno da carne em gelatina, enriquecendo e dando corpo ao líquido. Brasear é um método econômico, pois permite o uso de cortes rijos e mais baratos e eficientes, pois emprega uma só panela para cozinhar uma refeição completa.
Por causa de sua origem italiana, o ossobuco in bianco é tradicionalmente servido com risotto alla milanese, mas o corte bovino também pode ser acompanhado por purê de batatas ou polenta. Algumas vezes é servido com macarrão. 
Uma receita simples do ossobuc o alla milanese pode ser feita com seis ossobucos aparados, com cerca de 250 gramas cada, uma colher de chá rasa de sal, uma pitada de pimenta do reino, um quarto de xícara de farinha de trigo, uma colher de sopa de azeite de oliva, uma xícara de cebola média picada, meia xícara de cenoura bem picada, meia xícara de salsão bem picado, duas fatias de toucinho cru em cubos, uma xícara de vinho branco seco, uma xícara de caldo de legumes, 450 g de tomates inteiros sem pele, picados.
O ossobuco deve ser temperado com metade do sal e a pimenta e empanado na farinha de trigo. Numa panela despeja-se uma colher e meia de azeite e se refogam, em fogo médio, três ossobucos, dourando-os de todos os lados. Devem ser retirados da panela após 8 minutos e reservados numa travessa. Repete-se o procedimento com mais uma colher e meia de azeite, desta vez, adicionando-se a cebola, cenoura, salsão e o toucinho, refogando-os por 5 minutos ou até as hortaliças ficarem macias . Em seguida, adiciona-se o vinho branco, cozinhando-se por mais cinco minutos ou até o líquido quase evaporar. Adiciona-se o sal restante, o caldo e os tomates. Volta-se com o ossobuco à panela, até o caldo ferver. Tampa-se a panela, abaixa-se o fogo e cozinha-se em fervura lenta por duas horas ou até a carne ficar macia. 
Essa receita é uma reformulação da receita tradicional e tem por objetivo torná-la mais leve e menos calórica (358 kcal). Mesmo assim, não considero a receita original altamente calórica (cerca de 450 kcal). É um mito achar que o ossobuco é muito calórico. É um corte extremamente nutritivo e por ter o tutano, é rico em colágeno, que é responsável pela reposição de tecido muscular para crianças, adolescentes e idosos.

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