14.4.10

sobre a natureza das crises

Ainda na toada do Prof. Belluzzo, avançamos hoje pelo tema das crises financeiras em Marx.

Como o assunto é parrudo, vamos por pontos:

1) não há em "O Capital" nada explicito sobre a "crise final" do capitalismo. Há sim, a identificação de que, pelas contradições da própria dinâmica capitalista, o sistema tende recorrentemente a crises de superacumulação.

2) o conceito de crise de superacumulação não deve ser confundido com o de crise de subconsumo. Nos termos do próprio Marx, o subconsumo é uma constante estrutural do regime capitalista. Já a superacumulação decorre da tendência do capital de, por um lado, promover a constante ampliação de mais-valia e, por outro, produzir uma ampliação sistemática da composição orgânica do capital (i.é: amplia-se crescentemente a participação do capital fixo em relação ao capital variável) que, no limite, torna o capital abundante - note-se, abundante em relação às taxas de retorno vigentes na economia, não em relação ao capital variável. Com isso, ocorre uma desvalorização relativa do estoque de capital que termina interrompendo a dinâmica de reprodução capitalista.

3) Instaurada a crise de superacumulção, emerge o conflito entre diferentes parcelas do capital, em um processo que só se encerra quando parte do capital abundante é destruído para dar novo fôlego ao sistema.

4) À medida em que se desenvolvem o sistema de crédito e órgãos de "inteligência coletiva" com a missão de gerenciar o sistema financeiro (como são hoje os Bancos Centrais) cria-se uma instância de socialização das decisões de investimento que, no entanto, só age como tal, quando a crise já está em curso e faz-se necessário uma intervenção que permita que o processo de redução do estoque de capital se dê da forma menos deletéria possível.

5) É precisamente essa arquitetura produzida pelas próprias contradições do capital que instaura a possibilidade de socialização das decisões de investimento e que, no limite, abre a possibilidade para um novo regime. Porém, históricamente, o capital não ousa avançar sobre esse limite.

6) A chave do problema não está, portanto, na órbita da distribuição ou na questão da propriedade privada. O ponto crucial  é retirar da esfera privada as decisões de investimento. À medida em que o capitalismo avança, os instrumentos de socialização daquelas decisões também se desenvolvem, abrindo a possibilidade -ao menos teórica - de se pensar em um regime em que se possa manejar o estoque de capital de acordo com as demandas do conjunto da sociedade, eliminando o componente caótico e disruptivo que decorre das decisões privadas de investimento.

Pra encerrar, um comentário interessante do Belluzzo sobre a dinâmica contraditória do capital:

A idéia de "contradição em processo" refere-se ao fato de que o capital, ao rumar para o absoluto (que entendo ser, por um lado, a plena eliminação da concorrência intercapitalista e, por outro, a total independência em relação ao trabalho vivo), conduz o regime invariavelmente a crises de superacumulação que lhe revelam o seu caráter relativo e histórico.

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