25.8.09

feminismo às avessas


Um tema interessante a ser assuntado por aqueles que estão na lida das políticas sociais é a prerrogativa dada às mulheres no acesso aos benefícios sociais. Disseminada por organismos multilaterais como o Banco Mundial, o PNUD ou a FAO, esta prática presume que quando vinculados à mulher, os programas sociais resultam em maior percentual de êxito.

Justifica-se o fato com os seguintes argumentos: 1) as mulheres, principalmente as pobres, já desempenham "naturalmente" o papel de chefe da família; 2) a mulher tende a empregar de maneira mais responsável e altruísta os benefícios que lhe foram destinados; 3) Com o apoio dos programas sociais a mulher pode sair de uma suposta condição de submissão dentro da família, melhorando sua auto-estima e seus graus de liberdade.

Será?

Ouvindo recentemente a Prof. Ana Foseca, grande autoridade em programas de transferência de renda, fiquei conhecendo críticas bastante pertinentes sobre a tal questão da "centralidade na mulher".

Será que não se está reforçando a desigualdade intrafamiliar, conferindo maiores responsabilidades às mulheres e desobrigando os homens, inclusive do papel de provedor? E a suposta maior responsabilidade da mulher não é resultado - ao invés de uma "condição natural" - desta já desigual repartição de tarefas, agora acentuada e legitimada pelas políticas públicas? E será que é justo e desejável que qualquer anseio de participação do pai seja vetado a priori, estigmatizando-o e institucionalizando uma condição históricamente superada?

É, sem dúvida, não é nada fácil encontrar o modelo mais apropriado às políticas sociais. Eu mesmo, já fui um dia presidente do Banco Popular da Mulher aqui em Campinas, convicto de que nosso foco aperfeiçoava as ações da política de microcrédito, produzindo impactos sociais mais efetivos.

Vejo que provavelmente me enganei.

23.8.09

observando o observatório verde


O futebol, como raríssimas coisas da vida, promove uma deliciosa fusão da objetividade à subjetividade - somadas a apimentadas gotas do acaso. Iluministas que somos, gostamos de arquitetar teses e hipóteses solidamente fincadas nos fatos para justificar a paixão irracional que dedicamos a uma camisa, a uma história gloriosa de uma matilha que nos agrega desde a infância.

Quando os prognósticos falham, os gols não pintam ou o juiz mostra a que veio, cabe a cada um provar para si e para nossos parceiros de esgrima o quanto o acaso ou a rasa moral da arbitragem desfigurou o que parecia inevitável.

Mas, em compensação... quando a bola cutuca as redes do gol adversário, confirmando as teses rabiscadas no guardanapo, aí triscamos o Olimpo. Como semi-deuses mesclamos a paixão humana à oniciência de quem vê o mundo do alto - "falei, filha da puta!".

E por que este intróito?
Primeiro porque com mais de quarenta anos nas costas, continuo tão palmeirense quanto nos tempos em que José Silvério narrava os infinitos empates do meu sofrível palmeiras dos anos 80; segundo porque neste espaço da blogosfera, vai se cristalizando uma rede de blogs dedicados à Sociedade Esportiva Palmeiras que compõem um conjunto muito rico de análises futebolíticas. É o que o blog Observatório Verde denominou de mídia palestrina.

Pois é, a coisa tá tão avançada, que temos até um Observatório, colocando-se como uma espécie de blog-ombudsman do que andam pensando e escrevendo os seguidores da Cruz de Savóia.

Dito isso, convido os que até aqui chegaram para visitar o Observatório Verde, incluso a partir de hoje na Redondeza. Como poderão observar, os caras que o produzem são muito competentes, devidamente habilitados para analisar criticamente a quantas anda o nosso mundo verde.

PS: estive ontem no Jardim Suspenso de Parque Antártica assistindo o jogo Palmeiras 2 x 1 Inter-RS e participando de uma belíssima festa, abrilhantada pelo lançamento da camisa comemorativa do Palestra, inspirada na original, com a qual jogava em 1914. Foi um jogo ao estilo platino, de muita garra, muita vontade de ambos os lados e um tanto de lances brilhantes, como as arrancadas endiabradas de Diego Souza ou o belo gol de honra gaúcho, de Juliano. E atenção: ficou claro que brota um craque no Jardim Suspenso: Souza, volante de marcação, raçudo como deve ser por ofício, porém habilidoso e inteligente como poucos dessa posição.

18.8.09

avaliação das políticas sociais


Meus caros, convido aos que estiverem no entorno para participar do Seminário "Novos Instrumentos de Avaliação das Políticas Sociais" (veja programação aqui), que acontecerá na próxima sexta (21/9), no auditório do Colégio São José aqui de Campinas.

Para aqueles que atuam na área, acho que será bastante interessante. O que nos motivou a realizar esse debate foi a possibilidade de aproveitar o bom momento da racionalização da gestão promovida pelo amadurecimento do Programa Bolsa Família - que hoje disponibiliza uma ótima ferramenta de aferição do IDF (Indicador de Desenvolvimento da Família), além de um farto material estatístico - para debater, junto a grandes especialista no tema, sobre como potencializar o uso dos indicadores, seja para avaliação dos impactos produzidos pelas políticas, seja como apoio à gestão e ao planejamento. Parece árido? Nem tanto.

Começando com uma mesa com a presença do Prof. Marcio Pochmann (IPEA) e do Prof. Waldir Quadros (CESIT/UNICAMP) pretende-se abrir o leque sobre o estado das artes das metodologias de construção de indicadores disponíveis no país. O Marcio, na direção do IPEA, é referência obrigatória sobre o tema, até porque no pouco tempo que está no cargo já lançou diversos instrumentos de avaliação de políticas públicas e de diagnóstico social. Já o Prof. Waldir é outro craque no assunto. Ao longo dos últimos 20 anos, tem trabalhado na construção de uma metodologia de estratificação social que se pauta não pelos critérios de renda declarada, mas pela inserção social (costumes, padrão de consumo, relação de trabalho, etc) do trabalhador. Esta mudança de foco abre o campo de pesquisa para análises sociais mais ricas, menos sujeitas à precariedade das estatísticas de renda.

Encerrada esta primeira discussão, que tomará o período da manhã, teremos durante a tarde três conferências focadas nas especifidades das metodologias disponíveis(em especial o IDF). A Prof. Carola Arregui, da PUC-SP, irá explorar a questão do uso das estatísticas produzidas pelo IDF na gestão dos programa sociais, em especial o Bolsa Família. Já o Prof. Leonardo Mendes, (LarCom/Unicamp) irá demonstrar o que chamamos de Régua Social, uma ferramenta derivada do IDF, desenvolvida para a prefeitura de Campinas, que pretende hierarquizar as famílias dos usuários da rede pública municipal de acordo com diferentes dimensões de sua vulnerabilidade social. Com ela, não só poderemos avaliar os diferentes impactos no tempo de uma determinada política, como também estaremos equipados para elaborar melhores diagnóstico e ações de planejamento.Por fim, encerrando o evento, o Prof. André Pires (PUCCAMP)irá apresentar as linhas metodológicas de uma pesquisa que coordenou na cidade de Campinas, que buscava avaliar qualitativamente, junto às famílias dos beneficiários do Bolsa Família, qual as transformações (objetivas e subjetivas) que se pode associar ao programa.

A pauta é essa. Espero que gostem.

17.8.09

gracias por el fuego


Na última mensagem que enviei ao biscoito, sugeri ao Idelber Avelar que fizesse uma seção do Clube de Leituras comparando o livro "O Estrangeiro", de Albert Camus, com o livro "Gracias por el fuego", de Mario Benedetti.

Porém, algumas horas depois, eu e uma pá de gente caiu das teclas ao saber que o Idelber cometia seu blogcidio (vide post abaixo).

E agora? Agora tento eu aqui um arremedo de clube de leitura.

O que me fez pensar na comparação entre os dois livros foi o fato de que ambas as narrativas conduzem os seus protagonistas a uma inescapável sina homicida. Atordoados pela existência, pela escassez de sentido da vida, pelo absurdo do cotidiano, caminham para um crime que parece inevitável e que em cada qual se resolve a seu modo.

Até aí, nada de novo, são muitos os enredos que percorrem toadas semelhantes, com punsões de morte surgindo a partir de um protagonista crescentemente atormentado.
Mas, no caso dos dois a que me refiro, a comparação me parece especialmente interessante (e certamente poderia ser feita entre outros personagens parecidos) justamente porque, enquanto para Ramon Bundiño (de Benedetti) o caminho para o assassinato é pavimentado pelo excesso de nexos, por uma vida encharcada de sentidos, de determinações familiares, históricas e sociais (muito se trata da história da nação uruguaia), e só a morte resta como saída, para Mersault (protagonista de O Estrangeiro), a angústia existencial que lhe autoriza o crime decorre da fragilidade dos nexos que amarram o seu cotidiano, da forma fortuita com que é empurrados para o dia de amanhã, da porosidade das circunstâncias que, a depender do sol ou do barulho, são razões para a morte tanto quanto as de Ramon.

Justamente porque não compartilham das mesmas razões (ou melhor, porque suas razões têm naturezas quase opostas) mas vivem um descolamento da existência semelhante e se encontram motivados para um mesmo fim é que o paralelo entre os dois livros me pareceu rico.

Haveria ainda outra dimensão a contrapor os dois livros - a relação do indivíduo com o seu país - mas não me atrevo a tanto, até porque lembro menos de como isso permeava a narrativa de O Estrangiro, que li já faz um bom tempo.

Mas fica aí a sugestão. A quem interessar, fazer a leitura desses dois livros e se aprofundar na análise dos dois personagens.

11.8.09

biscoito à deriva



Uma nota triste:

Idelber Avelar anunciou ontem o seu blogcídio - temporário - alegando razões profissionais para hibernar o blog “biscoito fino e a massa”.
Obviamente, tem ele todo o direito e é perfeitamente compreensível que após cinco anos de intensa atividade resolva parar para respirar.

Entretanto, para quem navega na blogosfera a notícia não deixa de ser triste. Idelber inspirou muitos blogs e o "biscoito", assim como o blog do Nassif, era uma espécie de ponto de encontro virtual dos blogueiros. Era lá que 'tomávamos nossa cachaça'.

Além disso, impossível não mencionar o primoroso talento com que escrevia os posts, quase diários. Sempre inteligente, antenado, à esquerda e de rara sensatez, o “biscoito” teve papel importante em alguns episódios recentes: orientando os que perderam o rumo em New Orleans, durante o furacão Catrina; informando, como nenhum órgão da imprensa nacional foi capaz, sobre a incrível eleição de Obama ou fazendo campanhas como a de rejeição ao AI-5 digital.

Imprescindível destacar também o “clube de leituras”, com deliciosos exercícios literários, compartihando com o mundão sofisticadas análises de textos de autores latino-americanos, como se estivéssemos em um debate numa sala de aula sem paredes.

É verdade, tenho que reconhecer, que lamentavelmente o blog tinha um viés atleticano, mas nada que comprometesse o principal. Como o galo não ajudava, não houve grandes prejuízos.

É uma pena, seja pela ausência, seja por revelar as dificuldades que persistem.

Vá ser gouche nesta vida, Idelber. Mas volte, nem que seja no dia em que o Atlético vier a ser campeão!

P.S.: de qualquer modo, o link para o "Biscoito" permanecerá na "Redondeza", ali à direita. Além de seu significado histórico, mesmo inativo, contém um rico acervo de temas, suas análises e muitos palpites.

5.8.09

avante belluzzo!

Não posso deixar de saudar o Presidente Belluzzo pelo tapa na mesa: ninguém sai até o fim do campeonato brasileiro, sob pena de ele abdicar da presidência.
Louvável e de absoluta sensatez. Se o objetivo de um time é ganhar campeonatos, como explicar as trampolinagens mercantis que viram do avesso os nossos times de coração?
Que futebol é esse, que serve aos bolsos dos mercadores e não dá a mínima para a molecada que torce pelo seu ídolo?

Muito bem, Belluzzo!

Confesso que eu esperava que a presença do Belluzzo na presidência do Palmeiras extrapolasse os muros do Jardim Suspenso de Parque Antártica e fizesse se mover os pistoleiros que assaltaram o futebol brasileiro. Eis que a tigrada começa a se mexer.

Gol: no site do Estadão, Ricardo Teixeira já anuncia que deverá rever o calendário do futebol brasileiro em 2010, para evitar a revoada de craques no meio dos campeonatos.

4.8.09

minhas férias


Muita calma. Obviamente não vou contar aqui o que fiz nas últimas quatro semanas.
Mas aviso que minha passagem por Salvador (Bahia), bem como as revolvidas lembranças de Montevideo (propiciadas pela leitura Gracias por el fuego, de Mario Benedetti), me servirão de pauta para um tanto de posts futuros, que vou acumulando sob o rótulo "cinza is beautifull". Nada como uma cidade grande.

Por ora, tenho ainda pouco a dizer. Talvez, apenas, que acarajé bom mesmo é com caruru - coisa que a maioria das barracas não oferecem - e que melhor ainda é o da bahiana sem rótulo (nem Dinha, nem Cira) que monta sua barraca na frente do Farol da Barra, à esquerda de quem olha para o farol.