18.12.10

a inutilidade dos utilitários

Enquanto a nova classe média avança sobre as TV´s de tela plana e os fogões de 5 bocas, os novos ricos se divertem ocupando as ruas com seus utilitários - agora batizados de SUV´s (Sport Utility Vehicle).  São realmente enormes. Dos retrovisores de corpo inteiro, aos pneus que valem um fusca.Verdadeiros monumentos ao excesso: de irracionalidade, de individualismo, de mercadismo.

Mas, o que será que atrai tanto num SUV? Arriscaria dizer que, provavelmente, a possibilidade de dispor de suas descomunais utilidades.

É um habito antigo - acho que pelo menos desde as pirâmides dos faraós - expressar poder e status por meio da ostentação de excessos. Antes, porém, o hábito ficava restrito aos do topo - aristrocratas e sacerdotes. Já no capitalismo, como bem sabemos, sob a impessoalidade dos mercados e a dissolução de outros valores, todos podem - e talvez devam - buscar se posicionar na escala dos excessos. E nada como um SUV para rolar escada acima.

Eu também gosto. Já fui moleque e em algum rincão de minha psiquê continuo achando muito legal um carrão que enfrenta qualquer parada.
Mas, pera lá, não é como moleque que espero agir no mundo. Cada SUV que circula nas cidades é um estorvo e um enorme desperdício: de combustível, de espaço, de pneus, de paciência, etc...
Nas ruas e nos estacionamentos ocupam duas vagas; atravancam as faixas de trânsito, impedem a visão dos que vão atrás, poluem em demasia,... enfim, promovem transtornos de várias ordens, nenhum por motivo "utilitário".

E, por inúteis, acho que já é mais do que hora de se estabelecer limites e restrições à circulação desses carrões. Talvez ficassem proibidos de circular nas regiões centrais, talvez devessem pagar taxas salgadas para andar em solo urbano. IPVA por m²! Claro que nas propriedades rurais os SUVs poderiam circular livremente, mas, sabemos que provavelmente uma ínfima minoria dos que empapuçam o trânsito das metrópoles tem alguma relação com o mundo rural.

Aliás, um teste de proficiência para carteiras de habilitação especiais para SUVs talvez não fosse má idéia. Qual a diferença entre um pato e um marreco? Cachaço e cachaça? Entre um boi mocho e um garrote inteiro? Piçarra? Voçoroca? Não sabe? Vai pra casa de taxi.

9.12.10

combate à pobreza é benção para o sul maravilha

O atual presidente do IPEA, Prof. Márcio Pochmann, escreveu excelente artigo sobre os desafios que estão colocados ao Brasil, num momento em que se abrem possibilidades inéditas de consolidação de nosso desenvolvimento nacional. Trata de questões cruciais, pelo que me atrevo a dizer que é leitura obrigatória para quem se interessa pelo assunto (clique aqui para ler )

Contudo, destaco abaixo um trecho do texto, que não se refere especificamente à questão do desenvolvimento, mas que trata da destinação dos recursos da seguridade social no Brasil.

Como lamentavelmente assistimos durante a campanha eleitoral que recém terminou, o bom momento que vive o nordeste brasileiro fez arder os humores das gentes reacionárias que se aboletam no chamado sul maravilha. A grande transformação econômica e social que se verifica no nordeste do país,  promovida por um conjunto de iniciativas do governo Lula  - e que garantiram enorme votação à candidata governista na região - foi tratada pelos portavozes do sul/sudeste como se tivesse ocorrido em detrimento do desenvolvimento das demais regiões do país. Não foram poucos os gritos e muito mais numerosos os ecos que alardearam a drenagem de recursos do sul/sudeste para o norte/nordeste. Junto com a retórica econômica, difundiram-se ainda preconceitos que sugeriam uma disputa entre um sul moderno e dinâmico versus um nordeste atrasado e letárgico.

Quanta bobagem e que ignorância imperdoável que essa gente ilustrada de Higienópolis e adjacências carrega na papada!

Como bem mostra o artigo do Pochmann (e a economista Tânia Bacelar também tratou do assunto, sob outra perspectiva - leia aqui) os dinheiros fáceis que supostamente sustentam a bonomia e dão vida longa ao atraso são destinados na sua gigantesca porção - pasmem - ao rico sul maravilha. Nada menos do que 1 em cada 4 reais que são pagos a título de seguridade social (previdência + assistência social) vão para os bolsos de paulistas!

Vejam o que os números citados pelo presidente do IPEA nos contam:

"as famílias pertencentes aos estados mais ricos da Federação absorvem a maior parte do fundo público comprometido com transferências monetárias. Assim, a região Sudeste consome 50% do total dos recursos anualmente comprometidos com as transferências previdenciárias e assistenciais da seguridade social, dos quais 23,5% vão para São Paulo, 13,7% para o Rio de Janeiro e 10,9% para Minas Gerais. A descoberta dessas novidades no interior da dinâmica econômica brasileira atual impõe a reavaliação da eficácia dos velhos pressupostos da política macroeconomia tradicional. A economia social sustenta, hoje, parcela significativa do comportamento geral da demanda agregada nacional, além de garantir a considerável elevação do padrão de vida dos brasileiros, sobretudo daqueles situados na base da pirâmide social"


 Pois, que se calem os ignorantes, destas terras bandeirantes!

3.12.10

com bola murcha, meirelles acerta

Mais do que oportunas as medidas anunciadas hoje pelo Banco Central. Aliás, tardias.

Ao ampliar o compulsório bancário (ou seja, restringir o uso dos depósitos bancários como capital para empréstimos) o BC reduz a necessidade de elevação dos juros oficiais (taxa Selic) no futuro.

É de se lamentar apenas a maneira safada que a imprensa trata do assunto. O Estadão, por exemplo, deu a seguinte manchete: "BC diz que juro ao consumidor pode subir", quando deveria esclarecer que, ao reduzir a disponibilidade de crédito para o consumo, através do aumento do compulsório, o governo está abrindo a possibilidade de reduzir a taxa de juros dos títulos públicos.

Alguém poderá argumentar que não há diferença substancial entre subir a Selic e ampliar o compulsório, já que ambas as medidas visam frear o consumo e assim reduzir a pressão inflacionária. Mas, essa é apenas meia parte da história. O fundamental a ser dito é que, ao optar pelo uso do compulsório (constrição quantitativa), o governo abre a possibilidade de enfrentar a inflação sem provocar valorização do câmbio. E sabemos bem que essa relação selic-câmbio é hoje a mais grave ameaça à economia brasileira. Com a selic alta, atraímos capitais estrangeiros, valorizamos o real, perdemos exportações, ampliamos importações e, no final das contas, reduzimos o nível de emprego e a renda no país.

Claro que os jornalões, os mídia-ligeira e seus mais importantes patrocinadores (os bancos) vão gritar e fazer o possível para apresentar a solução anunciada hoje como indesejável e prejudicial para o público. A via do compulsório bancário reduz a amplitude dos capitais administrados pelos bancos e, com isso, diminuem seus lucros. Para o mercado financeiro, é sempre muito mais interessante que o governo lhes reduza o compulsório e cuide de frear o consumo via aumento da taxa selic. Com isso, mesmo que percam clientes na ponta do crédito, podem direcionar o "excesso de capital" para os títulos públicos e faturar numa nice o juros pagos pelo governo. O problema é que, como não podem contar essa história de forma clara, resta-lhes tergiversar e confundir o público.

Nossa sorte é que, a essa altura do campeonato, é só isso que lhes resta.