24.5.11

um debate oportuno

Nada como um catedrático, autor de gramáticas, fundador do Museu da Língua Portuguesa e, portanto, autoridade inquestionável sobre o assunto, para deixar claro os aspectos desconsiderados pelos doutos que, ignorantes e banhados em naftalina, saem por aí clamando pela "norma culta", como se a questão se resumisse a um debate jacobino.

É sintomático que uma polêmica como essa tenha surgido alguns dias após o episódio da "gente diferenciada". Plasmam-se no mesmo caldo de cultura, de uma classe dominante que vira e mexe se espanta com os novos bárbaros que emergem dos buracos de metrô, que consomem de maneira frenética ou que "assassinam" a 'norma culta' a três por quatro.

Para surpresa dessa gente reacionária, do jeito que a coisa vai, acabaremos falando como os franceses, que, como ensina o Prof. Ataliba, não pronunciam o "s" há séculos e que, a despeito do desvio, continuam encantando a trupe dos iguais.

3 comentários:

  1. Na mosca.

    E falando em debate jacobino: a posição do prof. Ataliba e de outros linguistas que defenderam o "livro do MEC" na grande mídia está longe de representar o "pensamento de esquerda" na linguística brasileira. São pontos pacíficos na área, hoje (e desde os anos 1970).

    Os debates aí são outros... um deles é a crítica à visão segundo a qual "norma culta" e "padrão popular" variam sem maiores dores. Alguns linguistas apontam este como um lugar violento de disputa de poder. Nesse sentido, o seu post me fez lembrar do seguinte trecho de um livro da linguista Marta Scherre, que trata justamente do famigerado "erro de concordância":

    “A grande questão é que, quando as marcas lingüísticas são marcas sociais, somos extremamente ditatoriais: queremos que prevaleçam as marcas dos grupos sociais de prestígio, que tendem a dominar tudo, até o conceito de violência. É comum ouvir que o mundo de hoje está mais violento do que o de antigamente, que o mundo de hoje está perdido, que os valores se foram. É só voltar ao passado e reviver, por exemplo, a escravidão institucionalizada para começar a pensar se o mundo de hoje está realmente mais violento. Quando as classes mais abastadas se sentem ameaçadas, aí, sim, se fala em violência, mas a morte generalizada de pessoas por falta de comida, quietas em seus cantos, sem voz, supostamente sem língua – no sentido social do termo , não costuma receber a denominação de violência.”

    Scherre, M. M. P. 2002. A norma do imperativo e o imperativo da norma - Uma reflexão sociolingüística sobre o conceito de erro. In: M. Bagno (org.) Lingüística da norma. São Paulo: Loyola. 217-251.

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  2. A polêmica e o debate desse tema é realmente muito oportuno. Não classificaria todos que se indignaram como "essa gente reacionária" que acho um rótulo um tanto quanto anti polêmica. Existem muitos pais e pessoas preocupadas com a questão do uso da norma culta e do dever das escolas de ensinar a norma culta. Quando começou o debate um amigo postou no Facebook um comentário sobre o assunto criticando o livro. Eu na mesma hora respondi que há muito tempo as formas não formais da língua são aceitas como regionalismos ou manifestações linguísticas de um grupo, e portanto que devem ser entendidas e estudadas. O português formal ou norma culta não é o único e nem poderia. Acrescentei no meu comentário que há quem diga que o português correto é o português das ruas, pois uma das funções primordiais da língua é a comunicação entre as pessoas no dia a dia. Completei que acho que todas as formas são manifestações de uma mesma língua, mas o português formal ou norma culta tem que ser entendido como a base, a matriz. Aceitar o modo de falar de uma pessoa do povo não é a mesma coisa que achar que ela fala correto dentro da norma culta. Assim como não vou à praia de terno nem trabalhar de sunga, procuro usar a língua da forma adequada ao meio e ao momento. E mesmo sendo defensor do português castiço, reconheço que a língua é dinâmica e mutável. Sabemos que você é uma contração de vossa mercê, que a conjugação ganhará é uma contração de ganhar irá.
    O debate é bom e melhor ainda pois permitiu várias pessoas de diversas áreas se manifestarem e mostrar preocupação com a língua, isso é uma evolução. Acho que nem a reforma ortográfica gerou tanto debate e defensores. Parabéns ao Brasil.
    Mas o Professor Ataliba no vídeo mostrou que o desrespeito a norma culta vem também do desrespeito a outras normas. É um reflexo de quando a impunidade impera, que denúncias não podem ser apuradas, que o dinheiro público é usado sem o devido cuidado.
    Muitos de esquerda defenderam também sem ler pois sentiram que o debate era apenas para denegrir o Lula. Assim como muitos da oposição atacaram sem ler nem entender pelo motivo oposto. Mas o fato é que o Lula mesmo sem dominar a norma culta domina a linguagem pois se comunica bem. Viva a flor do lácio inculta e bela.

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  3. Anônimo2/6/11 20:59

    E mais esse!
    Assistam...

    José Luiz Fiorin fala da polêmica sobre o livro didático "Por uma Vida Melhor"
    http://www.youtube.com/watch?v=o7OlNhxLrOg&feature=player_embedded

    (Aproveito para me identificar, aqui e no post anterior com a citação da Marta Scherre): sou eu, Maria Clara - oi Marcelo, oi Georges - pois só consigo posta como Anônimo...).

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