3.6.09

um "fórum privilegiado" para o Gastão


Hoje, 03 de junho, durante o período do almoço, viveu-se um belíssimo ato de solidariedade ao sanitarista e homem público, Gastão Wagner de Souza Campos.

Reunidos no salão nobre da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, nomes ilustres do movimento sanitarista, jovens militantes da saúde pública, servidores púbicos engajados na construção do SUS, professores, alunos, amigos, representantes de diferentes conselhos da sociedade civil, órgãos de classe,... enfim, uma legítima e democrática arena pública manifestou-se enfática e unanimamente contra os infames e absurdos processos criminais e cíveis que acusam o Prof. Gastão de envolvimento na chamada "Operação Sanguessuga".

Quando foi Secretário Executivo do Ministério da Saúde, ele autorizou emendas de deputados que propunham a transferência de recursos a entidades (Santas Casas, hospitais, municípios, que compõe o SUS) para que estas adquirissem ambulâncias. Ocorre que, os próprios deputados autores das emendas - mancomunados com empresas de preparação das ambulâncias - faziam chegar às entidades os documentos (pré-projetos) que induziam-nas a contratar os serviços das empresas do esquema, que obviamente realizavam o serviços a preços superfaturados.

Pois bem, embora o Gastão, como representante legal do Ministério, tenha autorizado as emendas, ele não mais estava no cargo quando efetivamente ocorreram os processos de transferência de recursos para as entidades (diga-se, entidades até então consideradas idôneas e parceiras regulares do SUS), nem quando foram feitas as contratações e as execuções dos serviços de preparação das ambulâncias, nem tão pouco quando estes foram pagos os mesmos. Ou seja, toda a ilicitude ocorreu em período posterior à sua gestão, quando ele já havia deixado o Ministério, justamente por discordar dos métodos do então ministro Humberto Costa.

Mas, na sanha justiceira que toma conta do poder judiciário brasileiro, o Gastão está sendo considerado como membro do esquema, como se estivesse articulado com os deputados e as empresas de preparação de ambulâncias desde o nascedouro, isto é, da autorização da emenda. Esqueceram-se, por exemplo, que ele nunca teve qualquer relação pretérita com os deputados, nem muito menos com as empresas; que ele jamais foi beneficiário de recursos vazados pelos tais Sanguessugas; que ele aliás vive vida de assalariado; que ele chamou a Polícia Federal e a CGU para investigar esquemas de corrupção dentro do Ministério (o que resultou na chamada operação Vampiro).

Se condenado nos diversos processos, além de multas que superam a cifra de um milhão de reais, será encarcerado por até 12 anos, perderá seus direitos políticos e jamais poderá atuar no setor público, onde sempre esteve, seja como professor, seja como gestor do SUS.

Por tudo isto, pela assustadora narrativa Kafkaniana contraposta à sua história de vida, pelo significado do movimento sanitarista como vanguarda das políticas sociais ante uma justiça que se encastela como retaguarda reacionária das instituições políticas, o ato de hoje foi mais do que uma manifestação de desagravo, como anunciava o convite, e mais do que um ato de protesto, como imaginávamos os indgnados. Transformou-se num grande momento cívico, de defesa da saúde pública, dos direitos humanos, das políticas universais, da radicalização da democracia, de expressão da Política.

E foram muitas as falas que trouxeram emoção ao auditório lotado. Entre leituras de apoio de autoridades públicas de todos os cantos, os presentes lembraram que o processo contra o Gastão atinge não só a ele, pessoa física, mas também a todos nós que lutamos dentro da esfera pública, contra um oceano de adversidades, na esperança de produzir uma sociedade mais digna, mais saudável, mais justa, mais alegre. Outros lembraram que, para quem trabalhou ou estudou com ele, seu nome remete à idéia de inventor do futuro. De fato, o Gastão é destes sujeitos que dão o passo sem ter certeza da pinguela, mas por compromisso absoluto com a ação política, vai em frente, deixando pontes espalhadas por ai. Alguns que estiveram juntos na lida, no cotidiano dos Centros de Saúde, lembraram como foi fundamental sua batalha intransigente para que os profissionais de saúde aprendessem a escutar e acolher as pessoas.
Claro, muitos falaram de sua trajetória no movimento sanitarista, na construção do SUS, e todos falaram de sua inquestionável conduta ética.

Por fim, o ex-aluno Thiago concluiu de forma brilhante. Chamou aquele ato de verdadeiro e legítimo "fórum privilegiado": onde, de fato, o Gastão foi julgado e absolvido.

4 comentários:

  1. É tão dificil transcrever em palavras escritas ou ditas o que vai dentro de mim, nesse momento. É muita revolta, raiva, indignação, desespero, desasossego, mas também, a certeza que a luta em defesa da ética, da justiça deve prosperar, sempre.
    Profesor Gastão, é referencia tambem na politica de assistencia social, nao foram poucas reunioes, seminarios, nas quais discutimos os conceitos, métodos, por ele cunhados e que acompnham aqueles profissionais que se destacam pela competencia e compromisso com a humanização e qualidade de atendimento no serviço publico.

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  2. Gastão tem a coragem e o peito aberto de enfrentar os interesses de mercado que tanto burlam a luta em defesa da vida.

    Da luta não se sai ileso: ela deixa marcas, mas sobretudo certezas. Isso eu aprendi também quando fui residente no DMPS/FCM/UNICAMP, vão-se agora alguns anos.

    É com este espírito de luta que precisamos ampliar este fórum e denunciar esta outra ética que se perpetua nas instituições e entre os trabalhadores de saúde - colocando o capital acima da vida.

    O compromisso do Gastão sempre foi com o inverso.

    Gastão, estamos com você na luta.

    Um beijo da Dani!

    Danielle Moraes, médica sanitarista, professora-pesquisadora da EPSJV/FIOCRUZ

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  3. parece mesmo mentira essa 'assustadora narrativa Kafkaniana', uma vingança do Estado Burguês.

    no mais,
    faz bem encontrar essa mobilização na Saúde!
    e belo texto.

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  4. Infelizmente não tenho ainda o privilégio de conhecer o Gastão pessoalmente, mas conheço o Gastão dos livros e como dia o francês André Rochais "sinto que tenho laços de ser com ele". Estas calúnias sofridas pelo nosso querido Gastão são na verdade um ataque ao Sistema Unico de Saúde. Sabemos que existe hoje um grupo de cidadãos( se é que podemos chamá-los assim) que naõ tem descansado em função de tentar destruir aquilo que o povo brasileiro conquistou com muita luta e participação.
    O coletivo da Humanização do RS está contigo nosso mestre GASTÃO, e acreditamos que o bem há de vencer!!!!
    Abraços "vontagiados"(vontade + contágio) pelo "SUS que dá certo"...isso temos aprendido com vc.....
    Loiva De Boni Santos

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